Prazos de processos administrativos trabalhistas são prorrogados até a volta do atendimento presencial

Foto: Helito Beggiora

Para auxiliar trabalhadores, advogados empresariais e trabalhistas respondem as principais dúvidas sobre o assunto, como férias, feriados prolongados e estágios

Devido à pandemia do novo coronavírus, prazos para apresentação de defesa e recurso nos processos administrativos de autos de infração trabalhista e de notificação de débito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), antes suspensos por força da Medida Provisória 927/2020,  foram prorrogados até a volta do atendimento presencial nas unidades descentralizadas da Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia. 

A MP 927/2020 não foi convertida em lei dentro do prazo constitucional e, por isso, perdeu a eficácia. Assim, deixou de valer a suspensão dos prazos processuais para apresentação de defesa e recurso, de 180 dias, e estes voltaram a correr normalmente.

A advogada trabalhista Maria Lucia Benhame, sócia do escritório Benhame Sociedade de Advogados, explica a situação: “Com a queda da MP 927, os prazos administrativos retomaram sua duração anterior. Em vista de não haver atendimento presencial,  prazos em curso durante o fechamento vencerão todos no 1º dia útil posterior à abertura”. 

De acordo ainda com Maria Lucia,  é  o que  estabelece a lei 9784/99 DOIS PRAZOS:

Art. 66. “Os prazos começam a correr a partir da data da cientificação oficial, excluindo-se da contagem o dia do começo e incluindo-se o do vencimento. Assim, deve-se ficar atento à abertura, e que os prazos  estão correndo e não serão  retomados na abertura”, alerta. 

§ 1o Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil seguinte se o vencimento cair em dia em que não houver expediente ou este for encerrado antes da hora normal.
§ 2o Os prazos expressos em dias contam-se de modo contínuo

De acordo com Renata de Oliveira Pinho Nagel, advogada empresarial do escritório Sotto Maior & Nagel, a Medida Provisória é um ato normativo emanado pelo Poder Executivo, que exige, para a sua edição, relevância e urgência. As medidas provisórias têm prazo de vigência de 60 (sessenta dias), podendo ser prorrogada por igual período. Ultrapassado esse prazo, caso a Medida Provisória não seja convertida em lei, os atos jurídicos praticados durante a sua vigência serão por ela regulamentados. Assim, a princípio, todos os atos praticados durante a vigência da MP serão por ela regulamentados. Todavia, surge dúvida em relação aos atos de natureza sucessiva, uma vez que são firmados durante a vigência da MP, mas que seus efeitos se prolongam no tempo, mesmo após a caducidade do referido ato normativo. Para esses atos sucessivos, a solução mais adequada é a sua regulamentação mediante decreto do legislativo, entretanto, por não ser obrigatória a edição, dúvidas surgem em relação a segurança jurídica. 

Jornal do Estado do Rio: Com a caducidade da MP 927/20, o que acontece com as medidas adotadas pelas empresas, durante o período de sua vigência, cuja natureza é de trato sucessivo? Ou seja, firmadas durante a vigência da MP 927/20, mas que se renovam após a caducidade deste ato executivo? Em especial, como será regulamentado o banco de horas firmado durante a vigência da MP, mas que o saldo positivo/negativo do banco de horas é surgido após a caducidade da MP 927/20. Deve se adequar ao prazo da CLT (6 meses, se firmado individualmente ou 1 ano, se firmado por negociação coletiva) ou a empresa pode continuar se utilizando do parâmetro de 18 meses estabelecidos pela MP? Qual a segurança jurídica, na adoção deste segundo entendimento?

Segundo a dra. Renata Nagel, em regra, os atos praticados pela empresa durante a vigência da MP 927/20 são por ela regulamentados e estão sob a guarida da sua proteção. Entretanto, é importante lembrar que o Direito do Trabalho, apesar de certa atenuação após a Reforma Trabalhista, é norteado pelo princípio da norma mais benéfica ao trabalhador. Em razão disso, pode-se surgir divergência quanto a continuidade das regras estabelecidas na MP 927/20, após a sua caducidade, quando se tratar de medidas de natureza sucessiva, como é o caso do banco de horas. 

Uma primeira possibilidade seria no sentido de impossibilidade de manutenção do banco de horas da MP 927/20 após a sua caducidade, em razão de ser mais prejudicial ao empregado (aplicação do princípio da norma mais favorável e da proteção ao empregado). Assim, de acordo com este entendimento, o ideal seria a empresa elaborar duas ‘contabilidades’ de horas, uma decorrente do saldo negativo/positivo durante a vigência da MP 927/20 e por ela regulamentada. 

E outra, seguindo os parâmetros da CLT, ou seja, estabelecendo-se a compensação em até seis meses (se firmado por acordo individual) ou em até um ano (se firmado mediante negociação coletiva). 
Noutro giro, outro entendimento seria que  banco de horas firmado durante a vigência da MP 927/20 se caracteriza como ato jurídico perfeito e acabado, podendo sim, a empresa continuar se utilizando do banco de horas com compensação em até 18 meses. A adoção deste entendimento gera risco para a empresa, uma vez que em eventual ação a Justiça do Trabalho poderia invalidar o banco de horas posterior a MP 927 e assim, a empresa ser condenada ao pagamento dessas horas. 

Jornal do Estado do Rio: Como será regulamentado os feriados futuros que foram antecipados pela empresa e gozados pelos trabalhadores, por autorização da MP 927/20? A empresa deve conceder novamente esses feriados e desconta-se o dia não trabalhado? Ou se considera como já usufruído e o trabalhador deve prestar o serviço em dia de feriado sem o respectivo acrescido da hora de trabalho?

A antecipação de feriados foi medida autorizada não somente pela MP 927/20, mas também por diversos decretos municipais e estaduais. Se a empresa concedeu a antecipação de feriados futuros, o fez com respaldo em ato normativo (municipal e/ou estadual) e pela MP 927/20, o que a torna válida e eficaz. Assim, o feriado já usufruído pelo empregado, mesmo que de forma antecipada, deve ser respeitado e não concedido novamente, em sua data original.

Jornal do Estado do Rio: Como ficam os contratos de teletrabalho firmados por aprendizes e estagiários, durante a vigência da MP 927/20? Explica-se: A autorização de teletrabalho para aprendizes e estagiários é decorrente da MP 927/20, na qual não existe regulamentação própria na CLT e na L. 11.788/08. Assim, as empresas devem determinar o retorno imediato do trabalho presencial ou podem manter esses trabalhadores em regime de teletrabalho? Quais são os riscos para a empresa? 

Dra. Renata Nagel explica que o teletrabalho para aprendizes e estagiários foi inovação da MP 927/00 e que não esta prevista em nenhuma legislação ordinária trabalhista. Todavia, importante se faz lembrar que o teletrabalho também não é expressamente vedado a essa modalidade de trabalhadores. “Para os estagiários, entendo pela possibilidade de continuação do teletrabalho, uma vez que a própria lei 11.788/08 autoriza a utilização da CLT como fonte complementar/suplementar. Já em relação aos aprendizes, a situação peculiar destes trabalhadores dificulta, na prática, a continuação da adoção do teletrabalho, uma vez que se exige a formação técnico-profissional, com realização de atividades práticas. Todavia, numa análise teórica, pode-se entender pela possibilidade de manutenção do teletrabalho a esses trabalhadores, com aplicação subsidiária e complementar da CLT, bem como diante da peculiaridade que o mundo esta vivendo no cenário de pandemia”, conclui. 

Jornal do Estado do Rio: O que acontece com as férias informadas pela empresa durante a vigência da MP 927/20, que autorizava a antecipação do período concessivo sem respeito ao prazo de comunicação estabelecido pela CLT (30 dias) e sem o pagamento antecipado do respectivo valor acrescido do terço constitucional (2 dias), mas que o início do gozo se dará após a caducidade deste ato normativo?

“Quanto as férias informadas ao empregado durante a vigência da MP 927/20, mas que o início do gozo se dará após a sua caducidade, entendo que a empresa deverá respeitar as normas estabelecidas na CLT. Ou seja, conceder prévio aviso de 30 dias, bem como pagar dois dias antes do início do gozo, o respectivo valor acrescido do terço constitucional. Isso porque, com a caducidade da MP, as normas excepcionais perdem vigência, devendo os atos que se caracterizam como expectativa de direito serem regulamentados pela legislação ordinária, ou seja, CLT”, explica Dra Renata Nagel.

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