Menos Tênis e mais Frescobol

Foto: Getty Images

A verdade que liberta os homens costuma ser a verdade que os homens preferem não escutar”.  – Zygmunt Bauman

Os cem anos que sucederam a Revolução Francesa (1789) foram tremendamente produtivos; o mundo não seria o mesmo depois de Hegel, Comte, Durkheim, Freud & Cia. Apesar disso, uma famosa frase de Wright Mills se ajusta como anel a essa plêiade: “O maior erro de Marx foi ter morrido no século XIX.” Aliás, se ajusta a cada pessoa, posto que o que é oportuno hoje, amanhã, aos olhos do futuro, talvez seja anacrônico. Portanto, a crítica de Mills se adapta também a Darwin e a sua tese da sobrevivência do mais capaz, que deu ao comportamento competitivo o status de mola propulsora da evolução humana.

No século XX o capitalismo se expandiu muito além do que Marx pode imaginar; e o fundamento do darwinismo foi acossado por surpreendentes descobertas. Entre as novas formas de ver merece destaque a teoria da simbiogênese, de Lynn Margulis, que atribui o protagonismo da nossa evolução aos comportamentos empáticos, solidários e cooperativos.

Em 1995 os economistas Adam Brandenburguer e Barry Nalebuff criaram o conceito de coopetição, para destacar que competir e cooperar são ações naturais, coexistem desde sempre e possuem entre si uma dinâmica complementar que passa despercebida por quem as analisa sem profundidade. Embora esse entendimento tenha conquistado respeito e ninguém duvide da força da competição, a ciência do século XXI avança no sentido de ratificar a conclusão do biólogo Jan Saap: “Nada na evolução faz sentido, exceto à luz da simbiose” – leia-se, exceto à luz da cooperação.  

Em qualquer tempo e sob quaisquer circunstâncias, sobretudo no gravíssimo desmanche socioambiental em que vivemos, competir ou colaborar gera faturas extremamente desiguais. O professor Rubem Alves, num artigo de décadas atrás, resumiu o dilema numa metáfora de proverbial simplicidade: não importa se somos casais ou nações, jogamos tênis ou jogamos frescobol!

Se a competição fosse constantemente mais poderosa do que nossa inclinação solidária, a espécie Sapiens já teria se extinguido; ou seríamos hoje, no máximo, um punhado de habitantes de cavernas. Para o bem e para o mal, nós existimos na condição de seres interligados. Disputas, atritos, divergências e conflitos são experiências reais e fazem parte da aventura humana; mas o ato de eu excluir você, seja você quem for, me desidrata e enfraquece. Não há como eu ferir alguém sem ferir, ao mesmo tempo, a minha própria humanidade!

Trata-se de escolher entre nos unir ou nos separar. A competição nos afasta. Competir hoje é se comportar com intolerância e extremismo; é negar a ciência, a diversidade, a mudança climática; competir é queimar livros e cultuar a ignorância. Competir é negar o amor e a compaixão. Já o ato de colaborar passa por fazer tudo isso de modo contrário. Fazer com amor. Colaborar é se mostrar igual ao outro. É ficar radiante ao ver o outro feliz. Colaborar nos aproxima; nos faz aceitar diferenças, respeitá-las e querer incluí-las. Simples assim: quem coopera ama, e quem ama é.

Bora jogar frescobol?

Alexandre Henrique Santos – Foto: @catherinekrulik

*Alexandre Henrique Santos é sociólogo, consultor de empresas, terapeuta e coach. Atuou mais de 30 anos em e para grandes corporações na área do desenvolvimento humano. Mora em Madri e dá palestras, consultorias e workshops presenciais e à distância na Península Ibérica e na América Latina. É meditante, vegano, ecologista, participa de trabalhos voluntários e campanhas de solidariedade. Publicou O Poder de uma Boa Conversa e Planejamento Pessoal, ambos editados pela Vozes. 

Contato: alex@ndre.com.br

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