Uma decisão da Justiça do Rio pode beneficiar os consumidores que tiveram que pagar cotas de condomínio de imóvel cujas chaves foram entregues com atraso. Por unanimidade, a Turma de Uniformização Cível dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça fixou a tese de que o prazo para reaver esses valores prescreve em 10 anos. A medida visa pacificar o entendimento sobre a questão entre as Turmas Recursais da Corte que, até então, vinham dando soluções jurídicas diferentes para casos semelhantes.
O colegiado, presidido pela desembargadora Maria Helena Pinto Machado, acompanhou o voto do juiz Eric Scapim Cunha Brandão, relator de um pedido de Uniformização de Jurisprudência feito pelos donos de um apartamento na Vila da Penha, Zona Norte do Rio. Eles alegam que desde abril de 2017 já pagavam o condomínio do móvel sem dele usufruir, pois as chaves só foram entregues pela Tegra Engenharia e pela TG Rio de Janeiro Empreendimentos Imobiliários em novembro daquele ano.
No entanto, o pedido de indenização por danos morais e materiais na ação movida contra as duas empresas acabou negado. Na decisão foi aplicada a tese de que a pretensão para a restituição foi fulminada pela prescrição trienal, pois a ação havia sido proposta após o término do prazo, isto é, em 23/10/2020, tendo o pagamento ocorrido em data anterior a outubro de 2017. Insatisfeitos, os donos do imóvel apontaram a divergência da decisão com outros julgados semelhantes.
Natureza contratual
Em seu voto, o juiz Eric Scapim reconheceu ter sido efetivamente demonstrada a existência da divergência entre as soluções encontradas pelas Turmas Recursais sobre o tema.
“A divergência consiste no confrontamento da tese aplicada em sede de sentença confirmada em Recurso Inominado, na qual foi fixada o prazo trienal do art. 206 §3º inciso IV, com base na vedação ao enriquecimento sem causa, e da tese defendida pelos requerentes, nos termos do entendimento firmado pelo STJ (EREsp no 1.280.825-RJ, EREsp no 1.281.594-SP e AgRg no REsp 1.384.376-RJ) e nos julgados da Segunda Turma Recursal (nº 0039865-37.2019.8.19.0203 e nº 0008591- 34.2019.8.19.0210), que entenderam pela aplicação do prazo decenal, em consonância com o art. 205 do Código Civil, em razão de relações de natureza contratual, as quais seriam análogas a presente demanda”, escreveu.
Ainda segundo o magistrado, verifica-se que existe um contrato celebrado entre as partes e, portanto, as cobranças indevidas de taxa condominial se encontram em um contexto de relação de consumo, fundamentadas num descumprimento da relação contratual, diante do atraso na entrega do imóvel que lhe serviu de causa jurídica.
Sendo assim, o relator ressaltou que a pretensão de restituição de valores pagos a título de cotas condominiais, antes da entrega das chaves, não deve obedecer ao prazo de prescrição trienal, seja com base no do art. 206 §3º inciso IV ou no art. 206 §3º inciso V, devendo ser observado, portanto, o prazo decenal, disposto no art. 205 do CC, dada sua natureza, advinda de um inadimplemento contratual e da inexistência de prazo específico na legislação civil.
“Isto posto, afasta-se a aplicação do art. 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil, para o caso em comento, eis que a pretensão de ressarcimento não advém do enriquecimento sem causa, mas do reconhecimento da abusividade da conduta em condicionar a entrega das chaves ao pagamento das cotas condominiais, independente da imissão na posse, atreladas ao inadimplemento contratual por parte dos réus, consubstanciado no atraso da entrega do imóvel”, concluiu.
Com a fixação da tese, a Turma de Uniformização Cível determinou a remessa dos autos ao órgão de origem para apreciação do recurso inominado dos donos do imóvel.
Processo nº: 0031533-26.2020.8.19.021
Deixe o seu comentário