São pelo menos 67 cidades brasileiras que já adotam a tarifa zero em todo o sistema de transporte, como mostra levantamento da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU)
O debate sobre a tarifa zero no transporte público, para garantir gratuidade aos usuários, é um tema que vem ganhando força em diversas cidades do Brasil, especialmente após as manifestações de 2013, que tiveram como estopim o aumento das passagens de ônibus. No Rio de Janeiro, a Comissão de Mobilidade Urbana do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ) vem acompanhando de perto as discussões em torno do tema. A proposta de implementar a gratuidade no sistema de transporte coletivo enfrenta resistências de diferentes setores, que questionam a viabilidade econômica, a qualidade dos serviços e o impacto ambiental da medida.
“Estamos há cerca de dois anos debatendo a mobilidade urbana no Rio de Janeiro. O Crea-RJ participa ativamente dessas discussões no Fórum de Mobilidade Urbana, junto com o Clube de Engenharia, a Federação das Associações de Moradores do Rio de Janeiro (FAM-Rio), órgãos federais, estaduais e municipais, além de parlamentares. É uma discussão ampla e que precisa da participação de toda a sociedade. Hoje, mais do que mobilidade urbana, necessitamos de um trabalho sério para a mobilidade humana”, explicou Itamar Marques da Silva Júnior, coordenador da Comissão de Mobilidade Urbana do Crea-RJ.
Vale ressaltar que o debate sobre a tarifa zero no Rio de Janeiro ganhou novo fôlego em 2022, quando o então candidato à Prefeitura, Eduardo Paes, prometeu criar um fundo municipal para subsidiar parte da tarifa dos ônibus municipais. A ideia era reduzir o valor da passagem de R$ 4,05 para R$ 2,00 para os usuários e implantar a gratuidade para todos os estudantes e pessoas com mais de 60 anos. No entanto, após assumir o cargo em janeiro de 2023, Paes afirmou que a promessa estava condicionada à melhoria da situação fiscal do município e à renegociação dos contratos com as empresas de ônibus.
Diante desse cenário, diversos movimentos sociais e organizações da sociedade civil têm se mobilizado para cobrar a criação da tarifa zero na cidade do Rio de Janeiro, por meio de manifestações nas ruas, campanhas nas redes sociais e projetos de lei na Câmara Municipal. Entre as propostas apresentadas, estão: a criação de um fundo municipal de mobilidade urbana sustentável, financiado por impostos sobre combustíveis fósseis e estacionamentos privados; a municipalização do sistema de transporte público; e a realização de uma consulta popular sobre a tarifa zero.
“Já faz tempo que os passageiros não conseguem mais pagar os custos dos sistemas e que as prefeituras e governos estaduais vem bancando uma parte, sem que se resolva isso. Temos que, urgentemente, encarar esse problema de frente. As empresas de transporte têm que passar a receber por quilometro rodado, sem preocupações com a lotação dos veículos, ficando os governos com a responsabilidade de pagar esses custos, que podem ser financiados por pedágio urbano, pela receita de estacionamentos, pela CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico relativa às atividades de importação e comercialização de petróleo e derivados), pela receita proveniente do pagamento de multas de trânsito, bem como por valores previstos nos orçamentos das três esferas governamentais”, explica Licínio Rogério, Coordenador-Adjunto da CMU do Crea-RJ, que ressalta: “Isso irá beneficiar principalmente passageiros que convivem com muitas dificuldades financeiras”.
Tarifa Zero
A tarifa zero consiste em eliminar a cobrança de tarifa dos usuários finais do transporte público, financiando o sistema por meio de recursos públicos provenientes de outras fontes, como impostos, taxas e subsídios. Os defensores da ideia argumentam que a tarifa zero é um direito social, pois garante o acesso à mobilidade urbana, à educação, à saúde, ao trabalho e ao lazer para todos os cidadãos, independentemente de sua renda. Além disso, alegam que a tarifa zero estimula o uso do transporte público em detrimento do transporte individual motorizado, reduzindo os congestionamentos, a poluição e os acidentes de trânsito.
Os críticos da tarifa zero, por outro lado, afirmam que a medida é inviável financeiramente, pois demandaria um aumento expressivo da carga tributária ou o corte de recursos de outras áreas prioritárias, como saúde e educação. Também apontam que a tarifa zero poderia gerar uma superlotação no sistema de transporte público, comprometendo a qualidade e a segurança do serviço. Além disso, questionam se a tarifa zero seria realmente eficaz para incentivar o uso do transporte público, considerando que outros fatores, como conforto, rapidez e confiabilidade, também influenciam na escolha modal.
Experiências em todo o país
Levantamento da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), realizado no último mês de março, mostra que pelo menos 67 cidades em todo o país já adotam a tarifa zero em todo o seu sistema de transporte, durante os dias úteis. São cidades pequenas e médias, com populações que variam entre 3 mil e 300 mil habitantes.
No estado do Rio de Janeiro, a cidade de Maricá, na Região Metropolitana, oferece, desde 2014, um serviço gratuito de ônibus municipais, chamado EPT (Empresa Pública de Transportes), financiado por royalties do petróleo. Maricá foi a primeira cidade brasileira com mais de 100 mil habitantes a implantar o passe livre.
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