Dados do IBGE mostram que 12% dos alunos já sofreram ferimentos nas escolas, enquanto números da OCDE revelam que 100 mil professores já foram vítimas de agressões, físicas ou verbais
A Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), presidida pelo deputado Flávio Serafini (PSOL), realizou um debate sobre a violência dentro e no entorno de escolas e universidades do estado. Representantes de instituições públicas, da Polícia Militar, Ministério Público-RJ e Defensoria Pública – RJ, foram ouvidos. De acordo com dados mais recentes da Pesquisa de Saúde Escolar (PenSe) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2015, 12% dos alunos já sofreram ferimentos no ambiente escolar e 14% deixaram de estudar por causa da violência. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 2013, 100 mil professores dos ensinos médio e fundamental foram vítimas de agressões físicas ou verbais, uma vez por semana. Esses dados fazem o Brasil liderar o ranking da violência em ambiente escolar.
Na tentativa de amenizar o quadro, a Polícia Militar do Rio de Janeiro criou o Programa Estadual de Integração na Segurança (Proeis), em dezembro de 2018, que tem como objetivo contratar policiais no seus dias de folga para aumentar a proteção em áreas previamente estudadas e programadas. “Os agentes de segurança são os mais interessados para que o sistema educacional funcione e assim nós possamos trabalhar menos contra a violência no âmbito escolar. Estamos dispostos a amenizar esse problema”, disse o tenente-coronel Camargo, representante do Proeis.
Mas os problemas com a violência nas escolas parecem crescer a cada dia. O ataque à escola na cidade de Suzano, em São Paulo, onde oito alunos foram assassinados por um ex- aluno, em março deste ano, foi um dos temas discutidos na reunião. A tragédia chama a atenção para a saúde mental dos estudantes. Segundo a Secretaria Estadual de Educação, este ano já aconteceram 76 casos de alunos que fizeram ameaças de ataque às suas escolas.
Diretora-geral do Instituto de Educação Professor Ismael Coutinho, em Niterói, Renata Azevedo afirmou que esse aspecto referente à saúde mental dos estudantes é de grande importância para a diminuição da violência em escolas. “ Não se trata de bandidos para matar e roubar um celular. Estamos tratando de casos de transtornos psíquicos que independe de idade. Precisamos de projetos sociais, psicólogos e acompanhamento do comportamento dessas pessoas”, destacou Renata, contando que um adolescente, de 17 anos, foi apreendido no último mês de março após ameaça por parte dele de ataque à instituição.
Violência sexual
E a violência no âmbito escolar não se restringe à agressão verbal e física. No ano passado, o Sindicato dos Servidores do Colégio Pedro II criou uma cartilha para auxiliar estudantes que sofreram abuso sexual. De acordo com a professora da instituição, Suelen Siqueira Júlio, as vítimas não sabem como proceder após sofrerem violência sexual. “A ideia é colocar no papel uma ajuda às vítimas sobre como identificar os abusos. Queremos dar aos estudantes os caminhos para a denúncia. Temos uma ouvidoria no colégio e uma comissão de ética”, informou a professora.
Durante o debate, promotores do Ministério Público-RJ questionaram as diversas formas de violência que acontecem todos os dias nas escolas e se mostraram contra o projeto Cuidar, lançado em abril pelo governo do estado do Rio de Janeiro. Entre as ações previstas no programa está a contratação de profissionais que já saíram das Forças Armadas, mulheres com formação na área de vigilância, policiais militares e civis, bombeiros e agentes penitenciários reformados ou aposentados para realização de serviços de portaria e inspeção patrimonial das escolas, atuando como Monitores Comunitários. Policiais militares também fariam patrulhamento a pé e em carros e motos identificados próximo aos colégios.
Segundo o promotor Rogério Pacheco, a proposta é ilegal porque utilizaria verbas da educação, cerca de R$ 40 milhões por ano, e que a segurança no ambiente escolar deveria ser feita por profissionais da Secretaria Estadual de Educação, como porteiros e inspetores, já capacitados pelo Ministério Publico. “Existem cargos vagos, então não há a necessidade de policiais reformados. Há inspetores capacitados para lidarem com situações de conflito em escolas. O Ministério Público quer saber da secretaria de educação como será a execução desse projeto”, questionou o promotor.
Charles Castro, coordenador de gestão intersetorial da Secretaria Estadual de Educação, informou que todas as questões mencionadas durante a audiência, inclusive sobre um possível replanejamento do Programa CUIDAR, serão encaminhadas ao Secretário Estadual de Educação, Pedro Fernandes.
Racismo também é violência
O racismo foi outro ponto abordado na audiência pública, sendo inserido no debate como outra forma de violência. Para Ana Gomes, do Grupo de Pesquisa em
Educação Étnico Racial, o problema ainda persiste de forma grave nas escolas e universidades, prejudicando o aprendizado de estudantes negros. “É importante perceber a situação do racismo como violência. Apenas 16% dos jovens nas universidades são negros”, afirmou Ana.
Próximos passos da comissão
À frente da Comissão de Educação da Alerj, o deputado Serafini afirmou que vai encaminhar um documento à secretaria de educação para sintetizar elementos, principalmente relacionados ao Projeto Cuidar. “Concordamos com o Ministério Público que o anúncio do projeto gerou uma frustração ao colocar policiais para conter situações de conflito. Precisamos de outras perspectivas de prevenção”, comentou o parlamentar, que afirmou ainda que quer respostas da secretaria como contribuição para o melhoramento da saúde mental dos estudantes.
Também participaram da audiência pública os deputados Waldeck Carneiro (PT) e Renan Ferreirinha (PSB).
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